Conhecido há mais de cinco mil anos, o azeite desempenha papel de destaque na gastronomia, enriquecendo e realçando sabores e aromas e conferindo resultados sensoriais distintos quando combinado com diversos alimentos.
O azeite é produzido a partir da azeitona, fruto advindo das oliveiras (Olea europaea L.), uma das árvores cultivadas mais antiga do mundo.
A azeitona contém ácidos oléico, linoléico, palmítico e esteárico, sais minerais, traços de vitamina A e D e oleoeuropeosídio. Enquanto a maior parte do azeite (>95%) é constituída por ácidos graxos ligados ao glicerol, os chamados triglicérides, há um elevado número de componentes secundários que apenas estão presentes em pequenas quantidades, mas que desempenham importante papel, sendo que alguns deles são benéficos para a saúde, enquanto outros melhoram a estabilidade do próprio azeite, e outros ainda são responsáveis pelo seu paladar único. Esses componentes secundários podem ser subdivididos em tocoferóis, fenóis, compostos aromatizantes, hidrocarbonetos e esteróis.
O azeite contém α-tocoferol, o tocoferol com a mais elevada atividade da vitamina E, em quantidades que variam entre 1,2 a 43mg/100g. Em média, a quantidade presente no azeite é de cerca de 12 a 25mg/100g; outras fontes determinam valores ainda mais elevados, de 24 a 43mg/100g. A quantidade de presente α-tocoferol no azeite depende de vários fatores. O processo de cultura, maturidade dos frutos, condições e tempo de armazenagem têm uma especial importância para o azeite.
A polpa das azeitonas contém compostos fenólicos, na sua maioria hidrossolúveis. No entanto, o azeite contém ainda algumas pequenas quantidades de fenóis. A classe dos fenóis inclui uma série de substâncias diferentes, de que fazem parte os compostos fenólicos simples, como o ácido vanílico, o ácido gálico, o ácido cumárico e o ácido caféico, e o tirosol ou hidroxitirosol. Em média, esses fenóis simples representam 4,2mg/100g no azeite extra virgem e 0,47mg/100g no azeite refinado. Além disso, o azeite contém secoiridóides, como a oleuropeina e o ligstrosido (2,8mg/100g no azeite extra virgem e 0,93mg/100g no azeite refinado, respectivamente), ou moléculas mais complexas, como lignanos (4,15mg/100g no azeite extra virgem e 0,73mg/100g no azeite refinado, respectivamente), além de flavonóides, como, por exemplo, a apigenina ou a luteolina. O teor do azeite em compostos fenólicos depende da forma de cultura e da maturidade dos frutos quando da colheita, por exemplo, a concentração de hidroxitirosol, tirosol e luteolina é tanto maior quanto maior for também o grau de maturidade das azeitonas, enquanto o teor total em compostos fenólicos e α-tocoferol diminui quanto maior for o grau de maturidade.
Mais de 70 compostos contribuem para o aroma e o paladar únicos das azeitonas e do azeite, entre os quais se encontram produtos resultantes da degradação oxidativa dos ácidos graxos insaturados, designadamente os aldeídos, como o hexanal, nonanal, 1-hexanol ou o 2,4-decadienal. Além disso, os hidrocarbonetos alifáticos e aromáticos, os álcoois, as cetonas, os éteres e ésteres, assim como os derivados do furano e do tioterpeno, dão uma contribuição apreciável para o aroma e o paladar do azeite.
O principal hidrocarboneto contido no azeite é o esqualeno, um triterpeno e um produto intermédio do processo de biossíntese do colesterol. O azeite extra virgem contém uma quantidade de esqualeno próxima dos 400 a 450mg/100g, enquanto o azeite refinado contém cerca de 25% menos. Alguns estudos concluíram que os níveis de esqualeno do azeite extra virgem se situam em cerca de 200 a 700mg/100g. Além do esqualeno, encontram-se igualmente no azeite outros hidrocarbonetos, como por exemplo, a provitamina A (β-caroteno), embora em quantidades ínfimas, como já mencionado acima.
Os esteróis são um componente essencial da membrana celular, sendo produzidos tanto pelos animais como pelas plantas. A cadeia de esteróis apresenta uma característica comum a todos os esteróis, residindo as diferenças na cadeia lateral. O colesterol é exclusivamente um esterol animal. Até o momento, foram identificados mais de 40 fitosteróis. No azeite extra virgem, o número de esteróis encontrados pelos diferentes grupos varia entre 113 a 265mg/100g de azeite. Dois dos fatores que influenciam esse valor são o processo de cultura e o grau de maturidade das azeitonas. O principal esterol do azeite é o β-sitosterol, que representa até 90% a 95% da porcentagem total de esteróis. O campesterol e o estigmasterol constituem cerca de 3% e 1%, respectivamente. Os estanóis são esteróis saturados, praticamente ausentes nas dietas típicas.
A casca da oliveira contém olivile, uma matéria branca e fusível a 70°, não azotada e que se dissolve nos álcalis, e ácido benzóico.
Multiplicidade de tipos e sabores
O azeite é classificado em diversas categorias, de acordo com o International Olive Oil Council (IOOC), sendo as três principais:Extra Virgem, Virgem e Azeite de Oliva ou Puro.
O azeite de oliva extra virgem é obtido da primeira prensagem, a frio, sem químicos, nem mesmo água. Tem aroma e sabor inconfundível, frutado. Sua acidez expressa em ácido oléico é, no máximo, de 1%. É o mais puro suco da azeitona e o óleo de melhor qualidade, com a maior quantidade de benefícios para a saúde. Por não passar por nenhum tratamento químico ou térmico, é justamente chamado de extra virgem.
O azeite de oliva virgem é obtido por prensagem mecânica adicional, após a primeira prensagem que deu origem ao extra virgem. Não são usados nem calor, nem químicos, apenas água como auxiliar na prensagem. Sua acidez expressa em ácido oléico está entre 1% e 2%. Pode ser usado para misturar com o óleo refinado, para adicionar flavor e baixar sua acidez.
O azeite de oliva virgem, logo após a sua produção, além das análises químicas, passam pelo crivo dos catadores (especialistas em análise sensorial). Esses especialistas desvendam e qualificam atributos sensoriais importantes para a classificação da qualidade do azeite. Esses atributos podem ser positivos ou negativos. Azeites de oliva virgens que apresentam atributos negativos são destinados ao refino ou descartados, portanto não são oferecidos aos consumidores. Já os atributos positivos podem ser encontrados em azeites de oliva virgens comerciais de boa qualidade.
O azeite de oliva refinado é extraído quimicamente com solventes, em alta temperatura, a partir da pasta que sobra após as primeiras prensagens a frio. Não tem mais gosto, sabor ou flavor (tal como um óleo de soja, de milho, etc.) até que seja adicionado outro óleo de maior qualidade. A acidez não pode ser superior a 1,5%, após a adição de outro óleo. Na ausência de mistura com outros óleos, é comercializado para uso industrial, por exemplo, para fabricação de sabonetes, cosméticos e outros. Não apresenta nenhum ou quase nenhum benefício para a saúde, já que a presença dos princípios ativos é quase inexistente. É vendido no comércio como “Azeite de oliva” ou “Azeite de Oliva Puro”.
Sinônimo de culinária de qualidade praticamente no mundo todo, a escolha do azeite depende da sua utilização. Os azeites suaves são excelentes para serem consumidos crus, no tempero de saladas, de legumes, de peixes brancos e também em omeletes, maioneses e pizzas. Os azeites com sabor mais frutado propiciarão maior personalidade as saladas e aos pratos de culinária regional. Para as frituras, os pratos com molho e a estufada, um sabor frutado mais intenso, com uma ponta de amargura irá realçar o conjunto.
O azeite de oliva extra virgem conserva todas as suas propriedades biológicas quando consumido ao natural, em saladas, temperos ou com pão fresco ou torrado.
Para sua conservação convém mantê-lo em lugares afastados de uma fonte de calor excessiva, de ar, de umidade e, particularmente, de luz.
Uma das raras características comuns do mundo mediterrâneo, tanto europeu quanto asiático e africano, ou as três religiões praticadas nessa região (católica, muçulmana e judaica), é a fritura dos alimentos. A fritura é uma dos métodos culinários mais antigos.
O fato da fritura ser de fácil ou de difícil digestão depende em grande parte do tipo de óleo utilizado e do método de fritura. Os resultados de pesquisas realizadas em pessoas saudáveis e em pacientes sofrendo de alterações gastroduodenais (gastrites, ulceras, alterações hepáticas e biliares) mostram que o consumo de alimentos submetidos ao processo de fritura com azeite de oliva não está relacionado a essas patologias.
Mais o teor dos óleos vegetais em ácidos graxos poliinsaturados é elevado (óleos de grãos), além da acidez inicial ser elevada (o óleo é mais estável quando apresenta um teor elevado de antioxidantes naturais - vitamina E), mais intensa e rápida será a alteração que os mesmos subirão ao calor. Isso também irá depender da temperatura, do tempo e do número de frituras, do processo utilizado (se a fritura é contínua, a alteração será menor) e da natureza dos alimentos fritos (a fritura de peixes, particularmente quando se trata de peixes gordurosos, aumenta o teor em ácidos graxos poliinsaturados, facilitando assim a degradação).
O azeite de oliva é ideal para fritura. Em condições adequadas de temperatura, quando não é aquecida excessivamente, não sofre nenhuma modificação substancial em sua estrutura e conserva melhor que os outros óleos suas propriedades dietéticas, não somente graças a presença de antioxidantes, como também pela sua riqueza em ácido oléico.
Possui ponto de fumaça elevado (210º), nitidamente superior a temperatura ideal de fritura dos alimentos (180º). As gorduras caracterizadas por pontos críticos inferiores, como o óleo de milho ou a manteiga, por exemplo, degradam-se a essa temperatura e passam a produzir substâncias tóxicas.
Outra vantagem do azeite de oliva é a formação de uma camada, na superfície do alimento, que impede o óleo de penetrar no alimento e lhe propicia um melhor sabor. Assim, os alimentos fritos em azeite de oliva apresentam teor de gordura inferior aos fritos em outros óleos, sendo assim a matéria graxa mais recomendada para o controle da obesidade. O azeite de oliva é, então, o mais adequado, o mais leve e o mais saboroso para as frituras. Comparado com outros óleos, apresenta também um rendimento superior, ou seja, pode ser reutilizado um maior número de vezes e seu volume aumenta quando aquecido, o que significa que precisa-se de menos óleo para cozinhar e fritar os alimentos.
A digestibilidade do azeite de oliva aquecido não apresenta nenhuma modificação, mesmo quando usado em várias frituras. Não deve ser misturado com outras matérias graxas ou gorduras vegetais e não deve ser utilizado mais de quatro a cinco vezes.
Além de conferir sabor e aroma aos mais diversos tipos e variedades de alimentos, o azeite também é um alimento extremamente saudável, característica esta associada à alta presença de ácido oléico, antioxidantes naturais e vitaminas em sua composição, o que contribui para a redução do LDL (“colesterol ruim”) e do colesterol total, sendo um dos principais alimentos presentes na Dieta Mediterrânea.
As propriedades medicinais mais frequentemente mencionadas estão relacionadas a diminuição de incidência de distúrbios cardiovasculares e à saúde digestiva.
Nos países mediterrâneos, onde o azeite é usado constantemente na dieta cotidiana, observa-se menor incidência de pessoas com distúrbios cardiovasculares e infarto do miocárdio, porque as gorduras insaturadas do azeite protegem o organismo e limpam os depósitos deixados pelas gorduras animais e certos óleos vegetais.
As gorduras insaturadas apresentam efeitos benéficos sobre as funções do fígado e dos intestinos; ativam as funções hepáticas e favorecem o fluxo biliar. A elevada taxa de gorduras insaturadas do azeite permite atingir uma digestibilidade de 100% contra 35% registrado para certos óleos de milho.
Além de gordura monoinsaturada, com altos teores de ácido graxo oléico, o azeite tem em sua composição compostos fenólicos (polifenóis), além das vitaminas A, D, E e K, que tem, respectivamente, ação antioxidante e benefícios específicos associados a cada tipo de vitamina.
Márcia Fani
Editora