Preparado com grãos de soja fermentados e salgados por salmoura, o shoyu é um dos mais populares condimentos utilizados na culinária mundial. Além de fornecer aroma e sabor a vários pratos, principalmente da cozinha oriental, a popularização desse condimento se deve ao fato de que faz bem à saúde!
O molho shoyu, ou molho de soja, é um dos condimentos mais benéficos para o organismo. Contém grande variedade de nutrientes, como proteínas, fibras, aminoácidos essenciais e lecitina, sendo que esta última ajuda na regeneração celular, entre outros benefícios.
Estudos comprovaram que o seu aporte de nutrientes proporciona uma vida mais saudável. Um estudo da Universidade Nacional de Cingapura, por exemplo, revelou que o molho de soja possui alto potencial antioxidante e, portanto, é recomendado para temperar saladas, no mínimo, duas ou três vezes por semana. Outros estudos têm mostrado que os produtos derivados da soja são benéficos na redução dos sintomas da menopausa, na melhora dos sintomas da artrite, no rendimento esportivo, bem como auxiliam na perda de peso e na redução dos níveis de colesterol total, lipoproteína de baixa densidade e triglicérides. O molho de soja também ajuda a reduzir o risco de doença cardíaca e melhora a saúde óssea, pois auxilia na retenção de cálcio nos ossos. Contém, ainda, uma série de antioxidantes que contribuem para reduzir os danos às células.
O aporte nutricional fornecido pelo molho de soja inclui 2,70mg de ferro, 8,70g de proteína, 19mg de cálcio, 1,60g fibra, 360mg de potássio, 0,20mg de zinco, 6,70g de carboidratos, 43mg de magnésio, 0,05mg de vitamina B1, 0,13mg de vitamina B2, 4,80mg de vitamina B3, 0,32ug de vitamina B5, 0,20mg de vitamina B6, 11ug de vitamina B9, 210mg de fósforo, 65,70 kcal de calorias, 0,10g de gordura e 2,90g de açúcar.
A quantidade de calorias é de 65,70 kcal por cada 100 gramas. O aporte energético de 100 gramas de molho de soja é aproximadamente 2% da quantidade diária de calorias recomendada para um adulto de meia-idade e de estatura média que realiza atividade física moderada.
A quantidade de proteína do molho de soja é de 8,70g por 100 gramas. As proteínas contidas no molho de soja são utilizadas pelo organismo para criar novas proteínas, responsáveis pela construção de tecidos, como massa muscular, e pela regulagem dos fluidos corporais, entre outras funções. As proteínas do molho de soja são formadas por aminoácidos, como ácido aspártico, ácido glutâmico, alanina, arginina, cisteína, fenilalanina, glicina, histidina, isoleucina, leucina, lisina, metionina, prolina, serina, tirosina, treonina, triptofano e valina.
As proporções dos nutrientes do molho de soja podem variar dependendo do tipo e da quantidade de molho, bem como de outros fatores que podem intervir na modificação dos seus nutrientes. De acordo com a preparação do molho de soja, suas propriedades e características nutricionais podem sofrer variações.
Basicamente, a produção de shoyu é realizada por fermentação natural ou por hidrolização química. Ambos os produtos obtidos são tão diferentes quanto os processos para produzi-los.
A fermentação natural é o método tradicional que tem sido utilizado durante séculos. É constituído por três etapas: preparação do koji, fermentação com salmoura e refino. O processo começa por uma cuidadosa seleção dos grãos de soja e de milho que serão utilizados no preparo (também pode ser utilizada aveia e/ou centeio). No Japão, o shoyu é feito de quantidades iguais de soja e trigo. Os grãos são mergulhados em água por 16 horas e, em seguida, cozidos por fervura prolongada ou sob pressão. Os grãos devem ser descascados antes ou depois do cozimento, sendo mais recomendado que esse procedimento seja efetuado antes do cozimento. No caso de ser usado trigo, pode-se optar pelo trigo integral previamente tostado e moído grosso ou pela farinha de trigo tostada. Os compostos aromáticos, como vanilina, ácido vanílico e etil guaiacol, são produzidos durante o cozimento do trigo e contribuem significativamente para o sabor e o aroma do molho. A farinha de trigo e os grãos de soja são vigorosamente misturados e inoculados com esporos de Aspergillus orizae, Aspergillus soyae ou Koji aspergillus, ou ainda, com uma porção de koji remanescente de uma fermentação prévia e incubada a 300C. Tradicionalmente, essa mistura é espalhada em camadas rasas em cestos de bambu ou bandejas de madeira, com fundo perfurado para permitir aeração. A fermentação se completa após três dias. Nesse estágio, ocorre a ruptura enzimática de proteínas insolúveis em polipeptídeos solúveis, aminoácidos, bem como a hidrólise do amido em dissacarídeos e a glucose e sacarose em glucose e frutose. Um considerável número de enzimas é liberado pelo fungo, como invertase, proteinases (ácidas, alcalinas e neutras), lipases, fosfatases, celulases, amilase e maltose.
Na segunda etapa, o koji, produto obtido na primeira etapa, é transferido para tanques especiais de fermentação e misturado com salmoura a 15% ou 20% de cloreto de sódio, formando, assim, uma massa chamada moromi. Inicia-se, então, uma das fases mais críticas e delicadas do processo: a fermentação do moromi. Essa segunda etapa tem duração mínima de seis meses a dois ou três anos. Nessas condições, muitos microrganismos desenvolvem-se como bactérias produtoras de ácido láctico, como Lactobacillus e Pediococcus, além de leveduras, como a Saccharomyces rouxii. A mistura transforma-se em uma pasta semilíquida de cor marrom avermelhada. É esse processo de maturação que cria e desenvolve numerosos componentes que constituem o perfil aromático do molho de soja.
Na última etapa, o molho no estado bruto é separado da torta, por pressão, passando pelos tratamentos finais de decantação, filtração, pasteurização, clarificação e, eventualmente, adição de conservantes químicos, sendo o líquido, finalmente, engarrafado para comercialização.
Já o método de hidrolização química, ou ácida, é mais recente e nele, o shoyu não demora mais do que alguns dias para ficar pronto para a expedição. Neste processo, primeiro, os grãos de soja são fervidos com ácido hidroclórico (ácido clorídrico) durante 15 a 20 horas. Após os grãos produzirem a quantidade máxima de aminoácidos, a mistura é resfriada, parando a reação hidrolítica, e, em seguida, neutralizada com hidróxido de sódio. O produto resultante é prensado, misturado com carvão ativado e, finalmente, purificado através de filtração. Normalmente, são adicionados corante caramelo, xarope de milho e sal a essa mistura de proteínas vegetais hidrolisadas.
Para melhorar a qualidade do molho de soja produzido por hidrolização química, muitas vezes, é aplicado um processo considerado semiquímico, no qual os feijões de soja são hidrolisados com menor concentração de ácido hidroclórico e, em seguida, adiciona-se o inóculo de moromi, porém sem a qualidade da etapa do koji. Embora essa alternativa melhore sensivelmente o sabor e o aroma, o produto resultante continua sendo um molho de soja químico.
Aroma e sabor
O molho shoyu é um dos condimentos mais conhecidos e antigo, amplamente difundido em várias partes do mundo e capaz de conferir sabor e aroma inigualáveis a qualquer prato. Contudo, esses dois atribuídos são fortemente influenciados pelos métodos de produção empregados, pois é a interação de todos os componentes, de forma unificada, que confere ao molho shoyu a sua complexidade única.
Nos molhos não fermentados, por exemplo, a hidrólise ácida tende a ser mais completa do que nos molhos fabricados pelo processo de fermentação natural. Como resultado, o perfil dos aminoácidos é diferente.
O conteúdo em nitrogênio total de um molho de soja indica a quantidade de materiais proteicos presentes. Um molho fermentado apresenta níveis de 1,65% de peso por volume. A determinação do quanto dessas proteínas foi convertido em compostos aromáticos pode ser obtida pela análise específica do nitrogênio dos aminoácidos e pelo cálculo da relação entre o nitrogênio dos aminoácidos e o nitrogênio total.
Embora essas relações sejam sensivelmente iguais nos molhos obtidos pelos dois processos, os resultados comparativos relativos ao ácido glutâmico e a relação entre o ácido glutâmico e o nitrogênio total variam de forma significativa, o que não somente gera diferenças na harmonia do molho não fermentado, como também pode significar que foi adicionado ácido glutâmico ou, ainda, que foi utilizada uma matéria-prima rica em glutamina ao invés da soja.
Outro aminoácido, o triptofano, também apresenta grande importância no perfil aromático; porém é totalmente ausente nos molhos produzidos por hidrólise química.
Além de apresentar perfil aromático totalmente diferente, a hidrólise química pode levar a ocorrência de várias reações secundárias, criando diversos componentes aromáticos questionáveis, não presentes nos molhos obtidos por fermentação natural. Entre outros, podem ser mencionadas as huminas, com sabor amargo e composição semelhante ao carvão; o ácido levulínico e o ácido fórmico; além do furfural e dos sulfetos de dimetila e de hidrogênio que, particularmente, possuem odores desagradáveis.
O equilíbrio dos ácidos orgânicos é fundamental para o aroma e sabor do molho de soja. No molho fermentado e no molho artificial, esses ácidos orgânicos diferem bastante. O principal ácido orgânico no molho fermentado é o ácido láctico, enquanto no molho artificial, o principal ácido é o fórmico.
O ácido láctico, de um modo geral, confere aos produtos nos quais é usado um aroma bem mais balanceado, suave, com efeito ligeiramente duradouro, sem, portanto, sobrepujar outros aromas mais sutis. Os outros ácidos não conseguem proporcionar o mesmo efeito.
Outra diferença significativa é a presença de ácido levulínico nos molhos de soja não fermentados. Como esse ácido não existe na natureza, oferece um outro meio para determinar, por análise química, de qual tipo de molho se trata.
Frequentemente, os molhos não fermentados não usam trigo como matéria-prima. A ausência de trigo, juntamente com a ausência de fermentação, significa que os açúcares não são naturalmente produzidos e, portanto, não podem estar presentes no molho, a menos que sejam adicionados à formulação. O sabor adocicado dos açúcares é fator chave do perfil aromático, bem como os componentes químicos que são formados pelos mesmos durante a fermentação. No processo, alguns açúcares transformam-se em álcool, um componente primário do molho de soja natural. Além disso, a maioria dos ésteres que contribuem para a formação do aroma, produzidos quando o álcool reage com o ácido láctico, são totalmente ausentes no molho artificial.
A reação de Maillard, que contribui para a formação da cor e aroma, nunca ocorre nos molhos não fermentados e, consequentemente, o desenvolvimento da cor característica não acontece, sendo necessária a adição de corante caramelo.
O conteúdo de sal ilustra bem como o sinergismo de ação entre os variados componentes do verdadeiro molho shoyu é importante. Comparando os dois produtos, pode-se observar que o conteúdo de cloreto de sódio é sensivelmente o mesmo para os dois tipos de molhos (16% a 17%, peso por volume), porém, na degustação constata-se que o produto não fermentado apresenta apenas um gosto salgado mais acentuado do que o produto fermentado, onde esse sabor é mais suave. Isso é resultado da interação dos outros constituintes, que trabalham em conjunto para melhorar o sabor salgado e fundi-lo melhor no conjunto aromático.
Além da sua contribuição direta em termos de aroma e funcionalidade, o molho de soja é um realçador natural de sabor, principalmente, devido ao seu conteúdo em aminoácidos. Muitos deles foram identificados como potencializadores de sabor e como agentes que contribuem para a formação do umami, mais notavelmente o ácido glutâmico.
Mas o conteúdo de ácido glutâmico do molho de soja não é o único fator que contribui para a sua capacidade de realçar sabores. Pode ocorrer sinergismo entre o próprio ácido glutâmico e o sal, criando um efeito que proporciona a melhora global do sabor.
O sal é um dos componentes que desempenha importante papel no preparo do shoyu. A salmoura adicionada no início da fermentação natural contribui para o paladar salgado; a concentração final em sal é de 12% a 18%. Mas o sal não é usado somente pelo sabor que proporciona, mas também por ser um componente essencial no processo. Em termos práticos, se o nível de sal adicionado for reduzido, as leveduras e bactérias do ácido láctico do moromi agirão de modo diferente, levando a obtenção de um produto final com perfil aromático e de sabor muito distante do tradicional. A concentração de sal também é importante para proteger o produto final e auxiliar na sua conservação.
O verdadeiro shoyu, obtido por fermentação natural, contém cerca de 300 constituintes identificáveis. Esses componentes trabalham em perfeita harmonia para criar o aroma e o sabor peculiar do produto, obtidos através do resultado direto de várias reações que ocorrem durante a fermentação.
Márcia Fani
Editora